24.1.08

Eu, Torga!

Nem é tarde nem é cedo!

Há já algum tempo, que andava com este post, literalmente, atravessado na lembrança. Ainda não o tinha editado, nem sei bem porquê! Uma coisa tenho como certa: aquilo que vou dizer, embora não seja segredo nenhum, também não pretende ser nenhuma maledicência, nenhuma blasfémia, nem tão pouco modifica nem ensombra, absolutamente, em nada, a ideia que tenho deste "nosso" enorme escritor. Tanto que, depois de já ter vários dos seus títulos, no ano passado, adquiri a obra completa de Miguel Torga.

Dois anos de docência em Sabrosa e outros tantos a almoçar em restaurantes de S. Martinho d'Anta, permitiu-me ter um contacto directo com algumas ideias e opiniões acerca de Miguel Torga. Se os alunos seus conterrâneos diziam coisas como: "tem a mania que é importante" ou "não liga a ninguém" outros espiritos mais esclarecidos e eruditos apelidavam-no de "arrogante", "snob" e até mesmo "intratável".

Por mim, ficava-me com a ideia que, talvez fosse resultado de alguma incompreensão da alma do artista ou algum sentimento de inveja impregnasse o pensar das pessoas da sua terra. Nunca tive muito em conta todas essas considerações. Quem tivesse lido "Contos da Montanha", "Novos Contos da Montanha", "Bichos" e "Vindima" na sua juventude, de certeza que, cresceria, tal como eu, com a imagem de um homem que (des)escrevia com experiência real, o ambiente rural do seu Reino Maravilhoso. Viamos ali uma fortíssima ligação à terra e às suas gentes, de modos pobres e rudes, o que demonstrava um profundo conhecimento do seu meio natural. Não ponhamos sequer em questão que, o universo torguiano, compreende melhor do que qualquer outro, o palpitar de Trás-os-Montes no seu sentido mais cru e mais autêntico, no encontro com o seu doloroso destino.

Mas, como é que, um homem que tão bem escrevia sobre o seu povo não tinha ligações com ele? No ano passado, aquando do centenário do nascimento do escritor, numa entrevista a um semanário local, o Padre Avelino, amigo e companheiro de caça de Torga, ele mesmo admite que, apesar de ser "um homem titânico e vertical, onde não havia mentira" não era "estimado nem reconhecido" na sua terra natal e as pessoas achavam-no "mal educado, duro, agreste", "homem de poucas palavras e pouco simpático". Consciente destes sentimentos adversários para com a sua pessoa, Miguel Torga desabafava com o seu amigo: "eles um dia mo dirão"!

E o que dizer então? Por mim, sem mais demoras, fico-me com uma frase de António Arnaut, no Jornal de Letras de 17 de Janeiro de 1996: "O homem é a sua vida, o escritor a sua obra".

monge

2 comentários:

avelaneiraflorida disse...

E da simbiose dos dois nasce o génio!!!!
Compreende-se essa distinção, porque nem sempre a afabilidade, o fácil trato está de mãos dadas com o sentir, o perceber os reflexos da
natureza na vivência quotidiana...
um escritor como Torga estará num plano acima dos outros homens...não vivem na mesma realidade!!!! E isso pode parecer " mau feitio"...

pronto, e se calhar sou suspeita, porque ADORO TORGA!!!!!
Bjkas, amigo!!!

Blue Eyes disse...

Parece mais o velho ditado de que "santos da casa não fazem milagres"...seja ou não este o caso certo é que enalteceu como ninguém o nosso querido Trás-os-Montes.

Pena é que a rudeza dos seus montes nos dificultem os acessos...o progresso...os empregos...a modernidade.Ficamo-nos apenas e só com o gostinho do regresso às origens e a amargura de cada saída da terra que nos viu nascer...

Beijinho e bom fim-de-semana.