5.5.12

Rimas de Petrarca
   


Acabado de sair da mesinha de cabeceira, este livro que Vasco Graça Moura intitulou As Rimas de Petrarca, é a primeira tradução integral para língua portuguesa dos Rerum Vulgarium Fragmenta, no título original, obra também conhecida por Canzoniere.
Edição bilingue com mais de 900 páginas, a obra é constituída por um total de 366 composições que se dividem em 317 sonetos, 29 canções, nove sextinas, sete baladas e quatro madrigais.
Como é que se lê um livro de poesia com esta envergadura? Como se leem todos os outros livros de poesia, suponho. Se a leitura não obrigar a uma disciplina sequencial, nada melhor do que vagabundear de poema em poema, qual salteador à procura de se encantar pela magia das palavras.
De Petrarca ficou-me apenas o nome, certamente mencionado pelo P.e Leão nas aulas de Português. Já que Petrarca é tido  como o criador do soneto (e tendo gostado especialmente de um), nada melhor do que deixar aqui alguma marca da sua genealidade. Eu de italiano non capisco niente, contudo gosto da sonoridade da língua e por isso a versão original do poema. Por pura curiosidade, procurei outras traduções, tendo ficado agradavelmente surpreendido pela variedade de interpretações, quer causadas pela riqueza da língua, quer pela sensibilidade poética de cada um. 

Pace non trovo e non ho da far guerra;
e temo e spero, et ardo e son un ghiaccio;
e volo sopra'l cielo e giaccio in terra
e nulla stringo e tutto 'l mondo abbracio.

Tal m'ha in prigion che non m'apre nè serra,
nè per suo mi ritien nè sciogle il laccio;
e non m'ancide Amor e non mi sferra,
nè mi vuol vivo nè mi trae d'impaccio.

Veggio senz'occhi, e non ho lingua e grido;
e bramo di perir e chieggio aita;
e ho in odio me stesso ed amo altrui.

Pascomio di dolor, piangendo rido;
egualmente mi spiacecmorte e vita:
in questo stato sion, donna, per vui.

Francesco Petrarca (1304 -1374)

Nem tenho paz nem como fazer guerra,
espero e temo e a arder gelo me faço,
voo acima do céu e jazo em terra,
e nada agarro e todo o mundo abraço.


Tem-me em prisão quem ma não abre ou cerra,
nem por seu me retém nem solta o laço,
e não me mata Amor, nem me desferra,
nem me quer vivo ou fora de embaraço.


Vejo sem olhos, sem ter língua grito,
anseio por morrer, peço socorro,
amo outrem e a mim tenho um ódio atroz,


nutro-me em dor, rio a chorar aflito,
despraz-me por igual se vivo ou morro.
Neste estado, Senhora, estou por vós.


Tradução: Vasco Graça Moura

Não tenho paz nem posso fazer guerra;
temo e espero, e do ardor ao gelo passo,
e voo para o céu, e desço à terra,
e nada aperto, e todo o mundo abraço.

Prisão que nem se fecha ou se descerra,
nem me retém nem solta o duro laço;
entre livre e submissa esta alma erra,
nem é morto nem vivo o corpo lasso.

Vejo sem olhos, grito sem ter voz;
e sonho perecer e ajuda imploro;
a mim odeio e a outrem amo após.

Sustento-me de dor e rindo choro;
a morte como a vida enfim deploro:
e neste estado sou, Dama, por vós.


Tradução: Jamil Almansur Haddad





Não tenho paz, e não me fazem guerra
Espero e temo, sou um gelo e asso
Aos ares vôo, tendo os pés na terra
Braços vazios, todo o mundo abraço

Aberta está a cela que me encerra
E nem me prende e nem se afrouxa o laço
Amor me absolve e não me desaferra
Ou me condenas e solta-me o baraço

Sem olhos vejo, e grito sem a língua
Eu, que amo tanto, sou por mim odiado.
Almejo a morte e clamo por socorro

Choro de rir, sou rico e sofro à míngua
E tanto faz, por mim, se vivo ou morro
Por ti, Senhora, é que ando neste estado.

Tradução:Sérgio Alcides

monge