15.9.07

Tempo de vindimas.


"A vindima requer braços e madrugadas. Sol e poesia!" Nem mais, Eremita!

Chegado Setembro é tempo de lavar as pipas para que fiquem devidamente "entouradas" de maneira que se tornem aptas a receber o nectar da colheita que se avizinha.
Participar numa vindima, é realmente uma oportunidade única para recriar ou reforçar laços antigos que, com o passar dos anos se aliam à experiência e saberes feitos, refeitos e novamente reinventados, porque é desta forma que a História continua.
Realmente, o dia das vindimas é um dia que começa bastante cedo, para que, por todos, a faina seja breve e assim evitar o sol abrasador que fustiga a vontade daquelas gentes. Não é tempo de horas lentas nem suaves, torna-se necessário conjugar esforços para que, numa actividade frenética se viva ao ritmo de ver a vinha despida de toda a força que a Natureza se encarregou de bafejar.
A vindima torna-se um acontecimento social muito significativo, porque é comum os familiares serem convidados a participar, o que geralmente é aceite de bom grado, agora por três gerações. Ao ritmo do trabalho, com a conversa nasce a vontade de partilhar experiências e recordar memórias vividas, por vezes repetidas de outras vindimas passadas.
Com os corpos já redobrados de cansaço, chega a hora da merenda que, regra geral, a minha tia faz sempre questão de se esmerar e oferecer uns deliciosos petiscos para retemperar as forças perdidas. Ao costumeiro bacalhau frito, à entremeada grelhada, ao salpicão e ao queijo, este ano juntaram-se uns morenos rojões e umas deslumbrantes alheiras tardias, juntamente com as respectivas azeitonas e a cebola crua salpicada de sal grosso. E tudo muito bem regado, claro está. Numa apetecida sombra, em volta da mesma causa, a amena conversa continua já com os mais velhos a deitar contas a quilos e a litros, sabedores de uma arte que não envelhece.
Se num instante fosse possível, com o horizonte aberto em todo o seu esplendor, onde quer que se esteja, seria fácil e imediatamente apelativo fazer parte de todo este imaginário e desta forma, encher o espírito e surpreendermo-nos com o que nos entra olhos adentro.
Por momentos, sentimo-nos parados no tempo e esquecidos no mundo.
Pois, mas falta esmagar as uvas e lavar os "cestos" (tinas) porque só ai termina a vindima.
À noite, de volta ao lagar e porque o vinho requerer calor, à velha maneira antiga com os pés descalços, trata-se de "trabalhar" todo aquele mosto que se vai provando molhando lá o dedo para ir descansando a conversa e alvitrar algumas previsões.
De regresso a casa, estafados e contentes, deitamo-nos com a satisfação do dever cumprido e quase com a audácia de poder exigir a lua.
monge



4 comentários:

avelaneiraflorida disse...

Que bom! o cheiro, as cores, o movimento....
È como reviver outras vindimas a que assisti ...na minha infância!!!
Outras ainda, em que participei, jovem aprendiza...sem que o cansaço (em que todos apostavam) me vencesse!!!
Lembro a pisa da uva no lagar...o cheiro do mosto...a azáfama, a alegria dos vindimadores...

BRIGADOS! do coração, por estas recordações!!!!
UM BOM DOMINGO!!!!
BJks

monge disse...

olá avelaneiraflorida

Felicito-te pela tua coragem, porque realmente, não há cansaço que consiga vencer toda esta vontade de passar momentos alegres e bons. Faltou aqui a tal reportagem sugerida (mea culpa)mas a imaginação consegue suportar essa ausência e garanto-te que para o ano, haveremos se tornar este dia mais vistoso. Até lá e que Baco, nas suas deambulações, se lembre de contemplar a seiva recolhida.
À nossa!
Um bj e volta sempre

monge

Anónimo disse...

Lá para as tuas terras, zonas temporãs, de uva prenhe de açucares, são ainda tempos quentes, os tempos de vindima.
A mim evoca-me dias mais frescos, em que a chuva ou o orvalho matinal pressagiam já o Outono que se aproxima, lesto, com uma brisa mais fresca... O cheiro da terra molhada e as cores realçadas pela água é o que mais prazer me dá lembrar:a substituição dos dias tórridos e estéreis do Verão pelas temperaturas amenas e a chuva-líquido-aminiótico do Outono...

Mas será que vamos ter direito a uma prova de tão distinto nectar, produto desse maravilhoso vale??

monge disse...

Pois é Claudino,
ainda nos resta a vindima das outras "nossas" terras que, como tu dizes, nos contempla sempre com um orvalho outonal mas não nos retira o mesmo prazer de lá estar.
Ao que parece este ano, não vale a pena levar a côdea no bolso para matabichar pela manhã, isto porque, contam-se pelos dedos os tristes bagos que por ali se encontram. No entanto ,vamos lá buscá-los e torná-los um argumento válido para fazer a última das sardinhadas, na horta.
Quanto ao nectar do vale, fica prometido levá-lo às costas, até uma próxima festa onde o pessoal se encontre.